+
Braz Coelho Veras Lessa Bueno
Idiomas
A incidência do ITBI na arrematação judicial e os desdobramentos do fato gerador sob a ótica jurisprudencial

A incidência do ITBI na arrematação judicial e os desdobramentos do fato gerador sob a ótica jurisprudencial

Publicado em 19 . April . 2024 . Insights
Autores . Matheus Cardoso
Áreas Relacionadas . Empresarial

O Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), previsto no artigo 156 da Constituição Federal, é um tributo cobrado quando há transmissão de direitos reais sobre imóveis inter vivos, ou, ainda, quando há a cessão de direitos relativos às transmissões.

A discussão em tela se dá, inicialmente, pela observância da Legislação Tributária do Município do Rio de Janeiro na aplicação do referido tributo aos casos de arrematação de imóveis em hasta pública. Nos termos do artigo 5º, VII, da Lei nº 1.364/88, considera-se como fato gerador do ITBI o momento da própria arrematação ou adjudicação, devendo o imposto ser pago pelo adquirente antes mesmo da expedição da respectiva carta, sob risco de aplicação de multa e juros moratórios, conforme entende o legislador no artigo 20, §1º da Lei nº 5.740/2014.

Entretanto, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro apresenta outro viés ao seguir os precedentes dos Tribunais Superiores para afastar a cobrança de multa e juros de mora sobre o ITBI relativo a imóveis adquiridos em arrematação, como demonstra a decisão proferida no Agravo de Instrumento nº 0064396-49.2021.8.19.0000, proferida pelo Desembargador Luiz Felipe Miranda de Medeiros Francisco, da 14ª Câmara de Direito Privado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. Arrematação de imóvel em hasta pública. Controvérsia acerca do momento de incidência do fato gerador para o cálculo do ITBI.  Guia expedida pela Fazenda que considerou a expedição da carta de arrematação como fato gerador do imposto, aplicando encargos de mora à Recorrente. Pleito de suspensão da exigibilidade da cobrança dos encargos. Tutela de urgência negada. Irresignação. Reforma. Probabilidade do direito evidenciada. Fato gerador do ITBI que se dá com o registro do título aquisitivo no RGI. Aplicação do Tema nº 1124, do STF. Periculum in mora configurado. Risco de dano irreversível de ordem patrimonial à impetrante. Precedentes jurisprudenciais deste Tribunal. Liminar que ora se concede, para determinar que o lançamento do tributo considere, como fato gerador, o momento de transcrição do título aquisitivo perante o RGI. Recurso a que se dá provimento.

Nesse contexto, o Tribunal carioca converge à alegação da Agravante no sentido de que o aperfeiçoamento da transmissão da propriedade apenas ocorre com o devido registro do título no Cartório de Registro de Imóveis, mencionando o artigo 35, I, do Código Tributário Nacional combinado com os artigos 1.227 e 1.245 do Código Civil:

AGRAVO Art. 35. O imposto, de competência dos Estados, sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos tem como fato gerador:

I – a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil.

Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código”;

Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.

Ainda com base neste entendimento, o TJRJ negou provimento à Apelação interposta pelo Município de Nova Iguaçu em face da sentença proferida na Ação de Repetição de Indébito[1], que declarou a nulidade dos juros de mora sobre o ITBI e condenou a Apelante a devolver a quantia indevidamente paga. Neste caso, o Município requerido também considerou a data da arrematação como fato gerador do imposto para cobrança de juros e multa. A ver:

APELAÇÃO CÍVEL. Ação de repetição de indébito. ITBI. Pretensão de devolução do valor pago a título de multas moratórias sobre o valor de ITBI. Arrematação em hasta pública. Sentença de procedência que declarou a nulidade do lançamento a título de mora sobre o ITBI e condenou o réu a devolver ao autor a quantia indevidamente paga. Manutenção. No ordenamento jurídico brasileiro, a propriedade entre vivos se transmite mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis, sendo esse o termo inicial da correção monetária e do

No mesmo sentido, entende o STJ:

TRIBUTÁRIO. BASE DE CÁLCULO PARA A INCIDÊNCIA DO ITBI. ARREMATAÇÃO EM HASTA PÚBLICA. VALOR ARREMATADO. MOMENTO DO FATO GERADOR. REGISTRO DO IMÓVEL. I – O Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência pacífica no sentido de que o valor venal para fins de composição da base de cálculo do ITBI é aquele consignado no próprio ato de arrematação. Precedentes: AgRg no AREsp 818.785/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/05/2016, DJe 13/05/2016; AgRg no REsp 1565195/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/12/2015, DJe 14/12/2015; AgRg no AREsp 630.603/PR, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/03/2015, DJe 13/03/2015. II – Com relação ao aspecto temporal do fato gerador, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é uniforme no sentido de que o fato gerador do ITBI é a transferência da propriedade imobiliária, que somente se opera mediante registro do negócio jurídico no ofício competente. Precedentes: REsp 1673866/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/08/2017, DJe 13/09/2017; REsp 1236816/DF, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/03/2012, DJe 22/03/2012. III – Agravo conhecido para negar provimento ao recurso especial. (AREsp nº 1.425.219/SP, Relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 21/02/2019, data da publicação em 01/03/2019)

Diante do exposto, conclui-se que a jurisprudência firmada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e o Superior Tribunal de Justiça poderá trazer ao adquirente alternativas à cobrança de multa e juros moratórios no pagamento do ITBI, considerando que o lançamento do tributo deverá respeitar, como fato gerador, o registro no RGI da efetiva transferência de propriedade.

Para mais informações, conheça as práticas de Societário, M&A e Empresarial do escritório Braz, Coelho, Veras, Lessa, Bueno Advogados.

 


[1] Processo nº 0034379-47.2020.8.19.0038

 

Matheus Sousa Cardoso
Legal Intern do departamento de Societário, M&A e Empresarial do BCVL – Braz, Coelho, Véras, Lessa e Bueno Advogados.
Graduando em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro.