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O instituto da transferência da concessão como importante instrumento de gestão dos contratos de concessão.

O instituto da transferência da concessão como importante instrumento de gestão dos contratos de concessão.

Publicado em 31 . August . 2023 . Insights
Autores . Lívia Casimiro
Áreas Relacionadas . Infraestrutura e Regulatório

Como se sabe, os contratos de concessão são ajustes de longo prazo, que envolvem objetos complexos e de grande vulto. Diante de tais características, a sobrevivência da relação concessória demanda uma gestão contratual eficiente, capaz de resolver uma série de desafios que poderão surgir ao longo da execução do contrato. Para tanto, o ordenamento jurídico previu mecanismos que possibilitam às partes realizarem ajustes contratuais no decorrer da relação concessória.

É nesse contexto que se insere o art. 27 da Lei n° 8.987/95, que autoriza a transferência do contrato de concessão a um terceiro, bem como a mudança do controle societário, desde que mediante prévia anuência do Poder Concedente.

A relevância prática do instituto foi expressamente reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal durante o julgamento da ADI n° 2.946, em que a Corte Constitucional declarou a constitucionalidade do art. 27 da Lei 8.987/95.

No acordão, a Suprema Corte concluiu que a dinâmica peculiar e complexa das concessões é compatível com mecanismos que permitam a realização de alterações durante a execução contratual. Segundo trecho do voto do relator, Ministro Dias Toffoli, “é natural – e até salutar – que o próprio regime jurídico das concessões contenha institutos que permitam aos concessionários se ajustarem às vicissitudes da execução contratual.”

Com a crise econômica brasileira de 2014, por exemplo, muitas das projeções realizadas pelas concessionárias se mostraram inferiores àquelas elaboradas na fase de licitação. Ainda assim, era preciso cumprir o cronograma de investimentos previamente acordado com o Poder Concedente. Além da crise econômica, a operação lava-jato impactou diretamente as sociedades empresárias que atuam no ramo da construção civil e, por conseguinte, os contratos de concessão por elas celebrados.

Naturalmente, tais circunstâncias demandam a celebração de ajustes que envolvam a alteração subjetiva dos pactos concessórios, que pode, inclusive, contribuir para o incremento da qualidade dos serviços prestados à Administração Pública. O que se defende aqui é que o instituto da transferência da concessão seria uma alternativa jurídico-regulatória eficiente para atender esse objetivo.

Aliás, essa foi a ferramenta utilizada para resolver a questão da paralisação das obras de implantação da Linha 6 – Laranja do Metrô de São Paulo. Após dificuldades no cumprimento do objeto contratual pela concessionária originariamente responsável pela sua execução, o contrato de concessão foi transferido para uma nova concessionária, com a anuência do Estado.

Durante o processo de anuência, o Poder Concedente avaliou que a opção pela manutenção do contrato se apresentava como a medida possível para evitar a produção de efeitos da extinção da concessão e, com isso, propiciar a retomada das obras, seguida da oferta do serviço público de transporte de passageiros na Linha 6 – Laranja, no menor prazo e com o menor custo dentre as alternativas disponíveis.

O caso foi expressamente citado durante o julgamento da ADI 2.946 como paradigma de sucesso e pode servir como parâmetro para que outras concessionárias possam avaliar a pertinência de se optar por essa ferramenta, considerando as negociações realizadas com o estado de São Paulo, bem como os instrumentos contratuais celebrados entre cedente (concessionária original), cessionária (nova concessionária) e Poder Concedente.

Apesar da relevância prática, a transferência da concessão não tem sido tratada com a importância que merece. Fato é que ela se revela como técnica eficiente para resolver alguns problemas enfrentados pelas concessionárias de serviços públicos. O desafio agora é abraçá-la como uma alternativa jurídico-regulatória eficiente de gestão dos contratos de concessão e aprofundar tal perspectiva de estudo.

 

Lívia Casimiro
Advogada do departamento de Infraestrutura e Regulatório da BCVL – Braz, Coelho, Véras, Lessa e Bueno Advogados.